A dimensão do abandono aos idosos

Foto: Corbis.com

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O “Fantástico” de domingo último, dia 13, exibiu diversas modalidades de violência contra pessoas idosas envolvendo cuidadores remunerados e familiares. A matéria afirmou que as “denúncias de crimes contra idosos crescem quase 200% em um ano”; que elas triplicaram entre 2011 e 2012; e que os “crimes mais denunciados são negligência e violência psicológica. Depois, vêm abuso financeiro e econômico, violência física e abandono”.

Há anos tenho a percepção de que os pronto-socorros se esvaziam no Natal, período em que, desde a antevéspera, há uma pressão familiar exagerada para que idosos e acamados em geral recebam alta. Simples. Natal é festa em casa, e nenhum familiar quer ficar em hospital com doente. Daí a insistência pela alta. Algo bem diferente do restante do ano.

Via de regra, a tendência é se insurgir contra a alta hospitalar, exigindo que seu familiar idoso ou fisicamente dependente permaneça no hospital ad aeternum, sob diferentes argumentos, mas, na base, em geral, está o desejo de não levá-lo para casa.

No Ano Novo, uma festa de rua, dá-se o inverso. A partir do dia 30, começa a romaria do retorno de idosos e acamados para o pronto-socorro, exigindo que fiquem internados. Até uma troca de sonda nasoentérica é motivo para uma esculhambação para que aquele doente fique no hospital. Um disparate total. Dá náuseas.

Há famílias, e são várias, que dão até endereço errado! Pelo rodízio familiar, era a vez de uma fulana cuidar do pai por uma semana. Simples. Ela chamou o Samu, sob o argumento de crises convulsivas (descobrimos que era mentira!), e levou o velho, que não tinha nada, apenas era acamado há anos. Ao fazer a ficha de atendimento, ela deu endereço e telefone de outra irmã e sumiu! A cuidadora viajou para o réveillon na praia! Foi um bafafá, porque a filha cujo endereço estava na ficha de atendimento se recusava a buscar o pai no hospital e só compareceu sob ameaça de um BO por abandono de incapaz! Chegou, cinco horas depois, esbravejando e ameaçou todo mundo de negligência, omissão de socorro…

Há casos em que a pessoa doente está de alta, sobretudo pós Acidente Vascular Cerebral (AVC), com sequelas incapacitantes para a vida autônoma, em que a família fica enrolando por semanas, alegando que precisa se preparar para recebê-la em casa… Se são muitos filhos, o hospital vira um ringue… Cada um tirando o corpo fora mais que o outro… Mas todos querem ser o “procurador” junto do INSS.

Houve um caso em que cada um dos quatro filhos solicitou declaração de que a mãe, com sequelas graves pós-AVC, estava impossibilitada de receber a pensão pessoalmente. Como a declaração havia sido dada à filha que a internou e que, perante o hospital, era a responsável por ela, inclusive em dois atendimentos anteriores, o mundo quase veio abaixo. Disse-lhes que fossem resolver o caso deles na polícia.

Todavia, o que mais dá a dimensão de completo abandono é de idosos, acamados e crianças com miíase (mye=moscas; ase=doença), o que se chama na roça de “bicheira”, coisa não rara em Belo Horizonte. Fico possessa, pois acho que gente não é para ser comida viva por bichos!

Puxando pela memória, expus, sucintamente, alguns casos, apenas para demonstrar diferentes graus de violação dos direitos humanos que as famílias perpetram contra seus familiares com dependência física de cuidados, com o intuito de demonstrar a banalização e a naturalização da violência a que estão submetidos no cotidiano. Alguém tem de dar um basta em tamanha desgraça.

Fonte: Jornal O TEMPO
 
Via: Viomundo
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